Alumiar os dias

Entrava Fevereiro e lá seguiam. As candeias alumiavam a noite e, para garantir que assim continuava, elas arregaçaram as mangas. Podiam ser só histórias, mas era melhor não arriscar quando a tradição já se cumpria há tanto tempo. 

Quando o trabalho o permitia, começavam cedo. Farinha e o pão em massa que tinham guardado da última cozedura. Juntavam o fermento e um cheirinho de aguardente e abafado. Laranjas e limões do pomar. O cheiro já fazia denunciava o que estavam a fazer. A abóbora bem escorrida e o cheiro a canela. Por último, os ovos. E agora, era meter mãos ao trabalho. 

Que o ano não fosse pior do que o anterior. Era assim que pensavam enquanto amassavam a massa. Uma fúria sem fim naqueles braços que aparentavam ser fracos, mas que nem tremiam com o esforço. O alguidar dançava em cima do velho banco de madeira a cada soco que a massa levava. E elas, de lenço na cabeça, lá continuavam. 

“Precisamos de azeitona boa”, pensavam. Quando não havia nada, era bom que o pouco se mantivesse. A azeitona, apanhada e escolhida para eles, servia de conduto nos dias mais difíceis e alumiava-os nas noites mais escuras. Era preciso que assim continuasse. 

Para isso, elas aqueciam o óleo no fogareiro que já diziam os antigos: 

-No dia de Nossa Senhora das Candeias tens de fritar nem que seja um ovo. 

E elas fritavam velhozes. Se era para cumprir, aproveitavam e adoçavam a boca, para amarguras já bastava a vida. 

O óleo a estalar e a massa a ganhar forma e a virar sobre si mesma. Ali estavam eles: douradinhos e cobertos de açúcar e canela. Fritos como se pede no dia de Nossa Senhora das Candeias. Que o azeite não lhes falte. 

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